2006-02-02

Sousa Monteiro e a gestão da TAP

TAP: DE FACTO MELHOR?
( Sousa Monteiro no Diário Económico de 2006-02 02)

1 – Os resultados da TAP, para serem positivos, parece que só com receitas extraordinárias! E não as havendo? Vêm os prejuízos, como está aí à vista em 2005, que até foi um ano bom para a aviação comercial, sobretudo para as asiáticas e as europeias. E, no entanto, no final do primeiro trimestre havia sido garantido um lucro de 15 milhões... Já no final de 2004, também um ano bom, os seus resultados líquidos ficaram-se pela pobreza de uns parcos milhões de euros. E se não tivessem sido as receitas extraordinárias da venda do handling, então o prejuízo teria sido de mais de 20 milhões!
2 – Os combustíveis são os culpados dos maus resultados? Mas... só por cá, pois as outras deram resultados positivos no mesmíssimo contexto. Ainda assim,
acaso a má orçamentação não é, também, responsabilidade da gestão executiva? Por exemplo: só há pouco tempo foi posto em prática o hedging, que permite uma defesa contra as variações dos preços do combustível. Justificação para este facto haverá, concerteza. Há sempre!
3 - Têm constituído também justificações para outras alturas de indesejáveis resultados o efeito “11 de Setembro” em Nova Iorque, e a gripe asiática, depois o preço do combustível, agora a concorrência das companhias low cost, etc.etc. Se tudo tem desculpa, mesmo o que não é admissível, então não faltarão “gestores” para a TAP. É que as outras empresas desenvolvem a sua actividade em iguais condições de mercado e agora são lucrativas.
4 – É boa solução vender os bons aneis, os que estão a render? O Estado não vende a Caixa Geral de Depósitos porque é uma empresa rentável, lucrativa. Então porque razão se há-de vender a participação na Air Macau? A resposta, que se pode ler nos jornais, e que eu não subscrevo, diz que é para ajudar nos resultados da TAP! É mais algo de extraordinário! Olha o que sucederia se a Torre de Belém fosse da TAP...
5 – Outro assunto: acaso também é culpa dos outros a falta de maior estreitamento das ligações aos Países Africanos de Expressão Portuguesa, que, esses sim, poderiam ser o Brasil da TAP? Eu só pretendia que já tivessem sido feitos os mesmos esforços neste sentido que foram feitos para com a ligação ao Brasil! E os equívocos e públicas confusões do famigerado negócio Varig/TAP? Agora, finalmente, parece ficar-se apenas com a empresa de manutenção VEM. Mas mesmo aqui, se o problema é a falta de espaço (que é real, de facto) , porque não encarar, também, a hipótese, já mais de uma vez sugerida, de explorar as potencialidades existentes aqui em Portugal? Seria investimento realizado no País e teria total cabimento no Plano Tecnológico deste Governo. E a incapacidade de a TAP liderar um projecto nacional de concentração com as outras empresas nacionais interessadas: SATA, Portugália, EuroAtlantic, etc? Valia mais uma estratégia concertada do que ver-se estas miniconcorrentes nas rotas da TAP, com preços de prejuízos mútuos...
6 - Todos os negócios são canalizados para o Brasil, incluindo a intenção do aumento de frequências e a abertura de uma linha para Brasília (é rentável?)! É, também, algo de extraordinário!
7 – Falta ao bom futuro (saudável) da TAP o que lhe sobra hoje de prática de “charme”, de marketing publicitário, de esforço/propaganda para melhoria de modificação da imagem. Mas eu pergunto: isto chega? Isto é DE FACTO uma TAP melhor? Não, definitivamente!
8 - Voar muito para o Brasil às baixas tarifas praticadas não tem feito melhorar a receita unitária média. Para Angola e restante África,sim. E agora já se pretende abrir mais linhas para o Brasil! Com estas tarifas? É dos livros: receita unitária abaixo do custo unitário é “desastre” garantido a prazo. Portanto, além de tudo isto que aqui aponto, eu tenho a certeza de que continua a faltar à TAP uma verdadeira reestruturação, visando um futuro diferente, MELHOR, incluindo a busca de jovens quadros de grande qualidade para tomarem um projecto competitivo em mãos. Onde está esta política na TAP? Ou joga-se no provérbio: quem vier atrás de mim ...
9 – Não me retaliem, por favor. Isto não é oposição por sistema. Isto é crítica construtiva, por causas! Eu coloco estas questões construtivamente, não visando pessoas, mas políticas. E aspiro: quando terá a TAP Resultados Operacionais e R. Líquidos positivos sustentados (e sustentáveis)? Claro que só depois de devidamente reestruturada. E, para mim, a política muito orientada na direcção do Brasil não é a panaceia, podendo, até, uma grande dependência trazer no futuro graves inconvenientes... Lembremo-nos da má experiência trazida à TAP por uma política de expansão semelhante em direcção a África antes das independências das ex-colónias... 10 - Termino, chamando a atenção que 2006 será um ano ainda melhor para a aviação comercial, como sabem os profissionais. Mas, se no final deste ano a TAP continuar com maus resultados operacionais e/ou líquidos, eu pergunto: que fazer? A situação permitirá continuar-se a viver de marketing/propaganda e permanentes justificações? Os bons gestores portugueses, que os há, e são a esmagadora maioria, condenarão isso. E igualmente todos os portugueses honestos. É que outrora ainda se podia ir ao Orçamento de Estado, mas tal não poderá suceder no contexto presente.

J.A.Sousa Monteiro, comandante sénior reformado da TAP, Professor na Universidade Lusófona

2006-02-01

NOTÍCIAS DO BRASIL ( 1) Sobre a eleição presidencial

(A preto, 3 parágrafos mais abaixo, a continuação do texto do PuxaPalavra)
A Câmara dos Deputados aprovou no passado dia 25 de Janeiro a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que põe fim ao princípio da “verticalização” em matéria de coligações eleitorais, ou seja, revoga a regra jurídica que obrigava os partidos (ou legendas, como aqui muito apropriadamente também se denominam) a seguirem nos Estados as mesmas alianças acordadas a nível federal. A proposta, que já havia sido aprovada pelo Senado, carece, para ser promulgada, de ser aprovada numa segunda volta pela Câmara.

É, porém, juridicamente discutível se a medida, a ser definitivamente aprovada, como tudo indica que vai ser, é, à luz da Constituição, de aplicação imediata às próximas eleições ou se ela apenas poderá aplicar-se às eleições que ocorram um ano depois da sua aprovação. Se esta tese vingar, caso o assunto venha a ser judicialmente apreciado, como parece que vai ser, a medida agora aprovada já não se aplicaria às próximas eleições, marcadas para 1 de Outubro próximo, mas tão-somente às de 2010.

A regra da verticalização aplicou-se pela primeira vez nas eleições de 2002, por determinação do Superior Tribunal Eleitoral. Em teoria, ela favorece os grandes partidos, consolida e potencia o seu desenvolvimento e crescimento a nível nacional, e garante alianças políticas válidas em todo o país, sem dissidências locais. Ao contrário, desfavorece os pequenos partidos que, tendo de optar entre a aliança federal ou a estadual, correm o risco, se optarem pela primeira, de inviabilizar em muitos casos as melhores soluções ao nível estadual, ou, caso optem pela segunda, de retirarem as vantagens de uma coligação no plano federal; bem como aqueles que, não sendo dotados de grande coerência ideológica, têm vantagens em ficar com as mãos livres para negociar caso a caso as melhores condições. Daí que o PT (Partido dos Trabalhadores) e PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), adversários no Congresso e na vida política nacional, se tenham aliado para impedir o termo da verticalização, e os demais partidos, PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) e PFL (Partido da Frente Liberal) incluídos, tenham votado em sentido contrário.

É opinião generalizada que o grande vencedor do fim da verticalização é o PMDB.

O PMDB é o partido do ex-Presidente da República José Sarney, do actual Presidente do Senado Renan Calheiros, de vários ministros do Governo Lula, de Nelson Jobim, Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), mas também de Anthony Garotinho, ex-Governador do Estado do Rio de Janeiro e candidato à Presidência da República em 2002, de Germano Rigotto, Governador do Rio Grande do Sul, e de muitas outras influentes personalidades da vida política brasileira. O PMDB, tendo herdado a sua sigla do Movimento Democrático Brasileiro, movimento institucional de oposição tolerado pela ditadura, num Congresso bipartidário então dominado pelo partido do regime, Arena, é hoje o partido que melhor ilustra as peculiaridades da vida política brasileira. Com o fim da verticalização, o PMDB poderá apresentar um candidato à eleição presidencial, apoiar a reeleição do Presidente Lula em alguns Estados (se Lula se recandidatar, como em princípio fará) e apoiar noutros o candidato do PSDB. O PSDB acostumado a fazer jogo duplo – como actualmente faz, quando através da ala governista apoia Lula no Congresso e faz parte do Governo e pela ala não governista faz oposição ao Governo nos Estados onde governa – poderá agora fazer jogo triplo. Esta criatividade ideológica a que não estamos habituados nos climas temperados vai certamente ajudar o partido a eleger grandes bancadas tanto nos Estados, como na Câmara e no Senado. Bancadas que depois serão indispensáveis para assegurar a governabilidade, principescamente recompensada com cargos e verbas.

Beneficiado será também o PFL (herdeiro em grande medida da velha Arena), aliado do PSDB desde 1994 (primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso), que assim negociará com os tucanos (nome dado aos partidários do PSDB) a aliança num contexto com várias alternativas.

Curiosamente, Lula sai também vencedor do fim da verticalização. Lula que, contrariamente ao PT, saudou a aprovação da proposta, tendo inclusive dado instruções ao representante da “base aliada” na Câmara para votar favoravelmente a emenda, não somente assegura por esta via o apoio de aliados tradicionais como o PSB (Partido Socialista Brasileiro) e o PC do B (Partido Comunista do Brasil), como ainda fica livre para tentar acordos parcelares com o PMDB, o PL (Partido Liberal), o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) e o PP (Partido Progressista). A grande aposta de Lula em matéria de estratégia eleitoral parece cada mais ser uma aliança com o PMDB, em que o lugar de Vice-Presidente da República seria ocupado por um nome forte da “legenda”, como Nelson Jobim ou Renan Calheiros ou, não podendo ir tão longe, uma aliança que, no mínimo, lhe assegure alguns “palanques”no maior número possível de Estados. Desfavoráveis a esta aliança serão os sectores do PMDB da ala não governista que aspiram apresentar uma candidatura própria, como parece ser o caso de Garotinho (hoje mais desgastado que há 4 anos e já sem o apoio dos evangélicos) e de Rigotto. Não é porém aconselhável fazer previsões nesta matéria, pois tudo pode acontecer. Pode até acontecer que o PMDB apresente uma candidatura própria com um nome da ala governista – Nelson Jobim. Tudo vai depender do resultado de uma criteriosa análise das vantagens e desvantagens a que a direcção do PMDB se vai dedicar nos tempos mais próximos.

Finalmente, o PSDB, que preferia abertamente a verticalização, vai ter que preparar-se para sofrer as investidas do PFL, tradicional aliado, agora com muita mais margem de manobra para fazer exigências. E este será um problema, a somar a vários outros, que o PSDB vai ter que resolver em matéria de eleição presidencial. De facto, embora o líder incontestado da oposição seja FHC, não apenas pela sua grande experiência política, mas também pela sua extraordinária craveira intelectual, a verdade é que ele não tem condições para disputar as eleições presidenciais com Lula. A recordação do segundo mandato de FHC, marcado no imaginário eleitoral pela crise económica e cambial, e, principalmente, pela frustração de muitas expectativas das classes populares, retira-lhe ainda hoje qualquer hipótese de êxito numa campanha eleitoral. Mas candidatos são o que não falta ao PSBD. Além do Presidente do partido, Tasso Jereissati, senador e ex-Governador do Ceará, e do actual Governador de Minas Gerais, Aécio Neves, neto de Tancredo Neves, que, por força das circunstâncias se viram obrigados a auto-excluirem-se da corrida presidencial, o PSDB tem ainda dois fortes candidatos que abertamente concorrem entre si: Geraldo Alckmin, Governador do Estado de S. Paulo e José Serra, Prefeito da cidade de S. Paulo, ex-candidato presidencial derrotado por Lula em 2002 e ex-Ministro da Saúde de FHC. Aberta a corrida entre ambos, uma corrida que o “estado-maior” do PSDB, para este efeito composto por FHC, Tasso e Aécio, se esforça por, simultaneamente, desvalorizar e arbitrar, vai ser muito difícil, sem ressentimentos e principalmente sem prejuízos junto das forças aliadas encontrar uma solução que a todos agrade. O PFL já “fechou” com Serra na Bahia, pela mão do ainda todo-poderoso António Carlos Magalhães, para assegurar que os dois anos que faltam de mandato à frente do município S. Paulo (o terceiro maior orçamento da União) fiquem sob a responsabilidade do número dois de Serra, um homem do PFL. Por outro lado, o presidente do PFL para apoiar o PSDB na eleição presidencial exige o apoio do PSDB na eleição do Governador de S. Paulo, a que o PFL quer concorrer com o número dois de Alckmin.